O mercantilismo do caos no sistema de saúde brasileiro
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O mercantilismo do caos no sistema de saúde brasileiro


Hospital de Campanha de Belém (PA) (Pedro Guerreiro/Fotos Públicas)

A Agência Sputnik Brasil publicou matéria, nesta sexta-feira (20), para debater a possibilidade de “fila única” para ocupação dos leitos nos hospitais, públicos e privados, enquanto durar a pandemia do novo coronavírus. “Em uma epidemia, a desigualdade fica escancarada”, observa o professor doutor em saúde coletiva da Faculdade de Medicina de Marília (SP), Gilson Caleman, ouvido pela reportagem e escancarando por que o sistema de saúde brasileiro não consegue dar resposta que a população espera. O debate também expôs à luz do sol um país que não conseguiu alterar a estruturação geral dos serviços públicos de saúde, onde a medicina previdenciária permaneceu hegemônica com seu modelo mercantil na saúde e sem preocupação se todo esse imenso contingente com centenas de milhares de pessoas infectadas atende a uma racionalidade médica ou não.

"Na fila de transplantes, quem tem maior necessidade de saúde, passa na frente. Não é porque a pessoa tem plano de saúde, que ela vai receber o transplante primeiro do que a pessoa coberta pelo SUS", pondera o professor, com esperança.

A seguir, a íntegra da matéria da Sputnik Brasil que põe em xeque o mercantilismo do caos na saúde.

O Brasil é o sexto país em número de mortes por COVID-19. Para diminuir a mortalidade da COVID-19, é necessário leito de UTI para atender os pacientes. Mas eles são insuficientes. O que fazer para garantir o acesso dos brasileiros a leitos de terapia intensiva?

O Brasil ultrapassou o Reino Unido e é hoje o terceiro país com mais casos de COVID-19 no mundo, com mais de 310 mil casos confirmados e mais e 20 mil óbitos, de acordo com a Universidade Johns Hopkins (EUA).

O que está acontecendo?

A doença se propaga rapidamente, e o índice de ocupação dos leitos de UTI públicos no país atinge níveis preocupantes: no Rio Grande do Norte, 96% dos leitos do sistema público estão ocupados, no Rio de Janeiro, a taxa é de 86%, de acordo com o Ministério da Saúde.

Para aumentar a oferta de leitos e salvar a vida dos brasileiros infectados pela COVID-19, é necessário aumentar a oferta de leitos de UTI de forma emergencial. Nesse contexto, surgiu a proposta de fila única, que gera debates acalorados.

A proposta tem o "objetivo de unir todos os leitos de UTI disponíveis", tanto públicos quanto privados, "e criar uma fila única de pacientes que, a partir do critério da necessidade, serão alocados para os leitos", explicou à Sputnik Brasil Gilson Caleman, professor doutor em saúde coletiva da Faculdade de Medicina de Marília (SP).

Por que criar a fila única?

A fila única visa ampliar o acesso dos pacientes aos leitos de UTI. De acordo com dados do Conselho Nacional de Saúde, o Sistema único de Saúde (SUS) tem sete leitos de UTI a cada 100 mil habitantes, enquanto a rede privada tem cerca de 32,8 leitos para cada 100 mil habitantes.

A fila única iria unir esses esforços, para que o Brasil atinja a capacidade de 14 leitos por cada 100 mil habitantes, isto é, dobraria a capacidade do país de atender pacientes em estado grave de COVID-19.

Além disso, a fila única deve garantir que todos os brasileiros tenham acesso igual à assistência de saúde, de acordo com a necessidade de cada paciente.

"Em uma epidemia, a desigualdade fica escancarada. A fila única deve ser implantada para que o sistema de saúde não agudize a desigualdade ao acesso à atenção médica no país", ressaltou Caleman.

"É uma questão técnica, de política de saúde, para que você não piore uma situação já grave de saúde pública", disse o professor.

O modelo é similar à fila dos transplantes de órgãos brasileira "que funciona muito bem [...] e é um exemplo para todo o mundo", comparou.

"Na fila de transplantes, quem tem maior necessidade de saúde, passa na frente. Não é porque a pessoa tem plano de saúde, que ela vai receber o transplante primeiro do que a pessoa coberta pelo SUS", explicou.

Como criar a fila única?

A fila única pode ser criada de duas formas: a primeira é a requisição dos leitos privados, que passam a ser gerenciados pela esfera pública.

Tocantins foi o primeiro estado a fazer a requisição de leitos nesta terça-feira (22), e todos os leitos privados estão sob gestão do estado, mediante pagamento realizado com recursos do SUS.

Em Curitiba também houve a requisição de leitos, mas por iniciativa municipal. O modelo foi imposto por decreto, e o estado irá pagar cerca de R$ 1.600 pela diária dos leitos.

Modelo alternativo é a contratação de leitos privados, medida adotada pelo estado de São Paulo nesta quarta-feira (20). Esse modelo se assemelha ao processo de licitação: a iniciativa privada coloca à disposição do poder público os leitos que julga estarem disponíveis.

Obstáculos à criação

No entanto, a implantação da fila única deve ser negociada com as operadoras de plano de saúde e com as administrações hospitalares, "que resistem a ter suas instalações controladas pelo sistema público", explicou Caleman.

"Nós temos 47 milhões de pessoas vinculadas ao sistema de saúde suplementar [privado]. O Brasil tem uma característica interessante: somos um dos maiores sistemas universais do mundo e o segundo maior mercado de saúde suplementar mundial, atrás somente dos EUA", contou Caleman.

Por isso, a implementação do sistema deve passar por intensa negociação com as administrações dos hospitais privados e com as operadoras de plano de saúde.

No entanto, Caleman lembra que o sistema particular funciona graças a incentivos fiscais garantidos pelo poder público, o que significa que a União também arca com os custos da saúde privada brasileira.

"Quem tem plano de saúde ou paga uma internação, desconta isso do imposto de renda. E não é pouca renúncia fiscal, fica em torno de quase R$ 15 bilhões por ano", explicou o professor.

Com a contratação de leitos de UTI, São Paulo deve pagar cerca de R$ 2.100 pela diária do leito, de acordo com a Secretaria Estadual de São Paulo. No entanto, alguns hospitais da capital paulista calculam que o gasto médio por paciente ao dia se situa em torno de R$ 2.800, diferença que poderá ser quitada na justiça.

Pós-pandemia

Para Caleman, a crise do novo coronavírus deve servir de alerta para que "a sociedade rediscuta o financiamento do SUS".

De acordo com estimativas do sanitarista Gonçalo Vecina, apresentadas durante debate sobre a fila única promovido pelo Conselho Nacional de Saúde, o Brasil precisaria de 20 a 24 leitos de UTI por mil habitantes para atender com dignidade a população em tempos normais, isto é, sem a pandemia de coronavírus.

"Não dá para trabalhar com um sistema desse porte investindo somente US$ 669 [R$ 3.736] per capita anuais. Portugal investe cerca de US$ 2.000 [R$ 11.169] per capita por ano. No Brasil, a gente tira leite de pedra", lamentou Caleman.

De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil já registra 310 mil casos de COVID-19 e 20.047 vítimas fatais. O Brasil é o terceiro país com maior número de casos e é um dos cinco países no mundo que ultrapassaram a marca de 20 mil óbitos por COVID-19, ao lado de Itália, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos, de acordo com a Universidade Johns Hopkins (EUA).

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