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Rio já monitora os seus macacos


Um grupo de trabalho formado por técnicos e pesquisadores de diversos órgãos se reuniu ontem (21) para debater um protocolo para o monitoramento de macacos nos parques e reservas naturais do estado do Rio de Janeiro. O objetivo é encontrar primatas mortos para serem recolhidos e examinados, mas também verificar a situação dos animais saudáveis nas matas.

Segundo a bióloga Márcia Chame, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), participaram da reunião técnicos do Ministério da Saúde, das secretarias de Saúde do estado e do município, do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), do Centro de Primatologia, do Jardim Botânico e do Centro de Zoonoses. Também estiveram no encontro professores do Rio Grande do Sul, estado que passou por um surto de febre amarela em 2008 e 2009. O trabalho é coordenado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

“Foi discutido e proposto pelos representantes do município e do estado que as suas unidades de conservação estejam com os seus gestores e guardas-parques treinados para poder fazer a notificação regular do encontro de seus primatas sadios, doentes ou mortos. Com isso a gente vai acompanhando o que vai acontecendo”.

Márcia explica que ainda será preciso estabelecer os procedimentos, como a regularidade dos relatórios, já que há grande diferença no tamanho de área e de pessoal que trabalha em cada unidade. “A gente vai começar a fazer a busca ativa de animais mortos no estado. Então, [vamos definir] como a gente organiza as equipes, quem vai para campo fazer a vigilância entomológica também, capturar mosquitos para ver se estão infectados ou não, quais são os mosquitos que estão circulando na região, quais são os macacos que estão ali, se foram mortos ou não”, enumerou.

Rio em atenção

De acordo com a bióloga, o resultado negativo para febre amarela nos macacos encontrados mortos no fim do ano passado na cidade do Rio de Janeiro é mais um indício de que a região metropolitana não apresenta a circulação do vírus.

“No contexto epidemiológico, não só o resultado de necrópsia desses animais, mas outras avaliações como o resultado da imuno-histoquímica [exame de laboratório]. Morreram macacos em outubro e novembro, se isso fosse de fato febre amarela, o que a gente esperaria eram mais animais mortos e, obviamente, alguns casos humanos já acontecendo. Isso não aconteceu, o que traz uma confiança, mas a gente tem que manter a atenção”.

Márcia participou de uma palestra sobre febre amarela na tarde de hoje (21) no Museu do Amanhã, na Praça Mauá, zona portuária do Rio de Janeiro. Ela explicou que a doença tem ciclos de sete anos, relacionados à recuperação da população de primatas que é afetada nas matas. Ela destacou que é impossível evitar um novo surto daqui a sete anos, pois “estamos em um país com matas e primatas, vírus e mosquitos”. A pesquisadora ressalta que a estratégia de vacinação tem mudado de acordo com a ocorrência dos casos.

“A estratégia já vem vindo [em direção ao Rio de Janeiro], tanto que de 2003 para cá, a área de vacinação foi ampliada e agora ampliou novamente. Essas coisas acontecem na natureza e a gente não tem essa capacidade de prevenção não. As medidas vão sendo tomadas a medida em que os casos vão se confirmando e vão ampliando essa área [de vacinação]. Tomar a decisão de vacinar significa correr o risco de pessoas que poderão ter problema com a vacinação, isso é uma responsabilidade. O Rio não é endêmico, só temos três casos confirmados. Está nos cercando, por isso precisamos ter atenção”.

Segundo a pesquisadora, estudos comprovaram que uma em cada 300 mil pessoas vacinadas contra a febre amarela pode ter complicações sérias, chegando à morte, já que a imunização é feita com o vírus atenuado, e não inativo. Márcia também destacou a degradação ambiental como fator que favorece a proliferação da doença, pois ela tem ocorrido em partes fragmentadas de floresta. “Quando o homem destrói a floresta, o mosquito não vai mais encontrar o macaco e vai usar o sangue do homem”.

Meio ambiente

Também pesquisador da Fiocruz, o historiador Jaime Benchimol destacou que a febre amarela urbana, que afetou boa parte da população do Rio de Janeiro no século 19, foi considerada erradicada da cidade na década de 1930.

“No Rio de Janeiro, a última grande epidemia foi em 1928. Em 1938 teve um caso muito parecido com o que está ocorrendo hoje, da febre amarela silvestre avançando, com quatro ou cinco casos de pessoas que adoeceram nas zonas de mata, vieram para a cidade e foram diagnosticadas na cidade. O último caso de febre amarela urbana foi em 1942, no Acre, desde então não teve mais”.

O vírus é o mesmo nos dois tipos, o que muda é o mosquito vetor. Na cidade, é o Aedes aegyptie nas matas são, principalmente, o Sabethes e o Haemagogus. Segundo Benchimol, há o risco do Aedes voltar a transmitir a doença.

“Em 2008, no Paraguai, teve uma epidemia de febre amarela por Aedes aegypti. Na África, em Angola e Congo, teve epidemia de febre amarela por Aedes aegypti. Então, a possibilidade de que o Aedes aegypti volta a servir de vetor para a febre amarela não é impossível”.

Ele destaca que, apesar do avanço da ciência, a ideia que se tinha em meados do século passado de que o homem controlaria as doenças infecciosas, se mostrou contraditória.

“A história, a medicina, as ciências biomédicas mostraram que aquela ideia que se tinha na década de 50, 60, de que a gente caminharia no sentido de que o homem e a ciência controlariam cada vez mais as doenças infecciosas, na verdade isso é um jogo muito contraditório e muito complexo. Às vezes a gente está por cima e às vezes está por baixo. É uma correlação muito instável. Os antibióticos, que eram considerados as grandes panaceias depois do pós-guerra, hoje você tem um fenômeno seríssimo, generalizado de resistência à maior parte dos antibióticos e de criação de novas cepas de bactérias e vírus, cada vez mais fortes e mais difíceis de serem combatidas”.


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