Confiança no Mergulhão desaba
JUSTIÇA DETERMINA MONITORAMENTO DA ESTRUTURA A CADA 48 HORAS
O discurso da prefeitura de Niterói – quase um mantra repetido invariavelmente nos últimos meses – de que o Mergulhão da Rua Marquês de Paraná é seguro se revelou mais frágil do que a estrutura corroída daquele túnel subterrâneo e ruiu por completo ontem, sob o peso da decisão da 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, acatando a maior parte das medidas de segurança e monitoramento exigidas pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro para a manutenção do tráfego na via.
Entre várias outras medidas, a prefeitura terá que iniciar, dentro dos próximos cinco dias, um rigoroso monitoramento das estacas-prancha, que formam as paredes laterais do mergulhão, verificando a cada 48 horas se essas estruturas estão sofrendo deformações. Em até dez dias o município também será obrigado a apresentar os editais de licitação, contratos, especificações técnicas, projeto básico, projeto executivo, relatórios diários da obra, enfim, todos os documentos pedidos e sonegados até agora pela prefeitura ao Ministério Público.
A decisão de ontem é uma vitória principalmente do trabalho realizado pelo promotor Fabrício Rocha Bastos, que esteve à frente das investigações até janeiro desse ano, quando ajuizou uma Ação Civil Pública, baseada em laudo de vistoria técnica do Grupo de Apoio Técnico Especializado do Ministério Público (GATE), que apontou inúmeros problemas estruturais. A ação também pedia a interdição do tráfego de veículos pesados sobre a laje do Mergulhão, que não foi acatada por ora. Na petição, o promotor chegou a fazer um apelo patético, dizendo que “a segurança da estrutura do Mergulhão está comprometida” e que “não queremos que o local seja palco de uma tragédia maior, com vítimas fatais”.
Denúncias do TODA PALAVRA
O jornal TODA PALAVRA tem sido o único veículo da cidade a denunciar insistentemente, desde o final do ano passado, seja em suas publicações mensais impressas, seja em suas edições digitais diárias, a gravidade das suspeitas sobre a segurança da obra. A última edição impressa mostrou fotos exclusivas feitas de madrugada dentro do Mergulhão, já na atual fase de obras de manutenção, iniciadas há cerca de 15 dias, mostrando o alto nível de corrosão e de infiltração da estrutura. A mesma matéria, que demonstrava o caráter superficial dessas intervenções – na verdade, uma mera maquiagem ao custo de R$ 1,5 milhão para os cofres municipais – trazia uma declaração do empreiteiro responsável pela obra, Vitor Hugo da Rosa Amaral, dizendo que não garantia “em nada” a parte estrutural do Mergulhão.
A investigação do Ministério Público foi iniciada depois que a Escopo Engenharia, empresa responsável pela cravação das estacas-prancha, denunciou uma série de problemas estruturais. Entre outras coisas, a construtora dizia que a estacas seriam provisórias e foram tornadas definitivas quando o prefeito Rodrigo Neves, após sua primeira eleição para a prefeitura de Niterói, determinou que as obras, paralisadas na gestão anterior, fossem retomadas, sem considerar os problemas do projeto.
A Escopo apresentou, no final do ano passado, um laudo técnico realizado por sua conta onde foram apontados vários problemas. A empresa insiste até hoje que, por serem provisórias, as estacas teriam uma “ficha” (parte que fica enterrada no solo) de apenas dois a três metros, enquanto o mínimo aceito para aquele tipo de projeto seria uma cravação de mais de cinco metros para dentro da terra. Na última edição impressa do TODA PALAVRA, Vitor Hugo também revelou que no estacionamento subterrâneo de Charitas, obra a ser entregue nos próximos dia e também sob a responsabilidade da sua empreiteira, a Joama Engenharia, as estacas-prancha, similares às do Mergulhão, foram enterradas a uma profundidade de nove metros.
A ameaça que vem da água
Outra preocupação é uma adutora da Águas de Niterói que passa a cerca de um metro de distância apenas de uma das laterais do Mergulhão. Por conta disso, a Justiça determinou também a apresentação, no prazo de 60 dias, de relatório de manutenção da tubulação; protocolo de atuação para contenção em caso de acidente com a adutora; levantamento do nível da Rua Marquês de Paraná para monitorar acomodações do solo junto à parede do Mergulhão, numa faixa de sete metros; e, preventivamente, que a Águas de Niterói diminua a pressão e vazão da tubulação enquanto as demais providências não tiverem sido tomadas.
Também está sendo exigida a elaboração e apresentação em até 30 dias de projeto de segurança contra incêndio e pânico; o reparo de desplacamento de revestimentos, a sinalização do local, com placas de altura máxima permitida de sobrecarga máxima de passagem em até 60 dias.
Paralelamente ao recurso ingressado pelo MPRJ, a Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural de Niterói indicou assistentes técnicos para que seja realizada a perícia anteriormente determinada pelo juiz. A Justiça fará o agendamento da perícia.