Centro de Niterói: quem segura as pontas é a Cultura
Artigo publicado na edição impressa de outubro do jornal Toda Palavra
Moro no centro de Niterói há mais de 20 anos. Amo viver aqui e hoje não trocaria residência por outro bairro da cidade. Muita gente só passa pelo Centro, que tem esse desafio delicado do transporte público (e o enorme fluxo das cidades vizinhas rumo ao Rio, tanto por Barcas quanto pela ponte). Quem reside no Centro percebe um pouco melhor a sua dinâmica interessante e, até mesmo, o humor bucólico, interiorano e calmo de alguns de seus logradouros acessórios e a potência enorme, viva e pulsante, das comunidades que estão aqui.
Quando Niterói foi capital de Estado houve ciclo virtuoso aqui, da qual as grandes praças e vistosos prédios públicos são, até hoje, testemunhas. Esse momento de vitalidade está impresso no vasto conjunto arquitetônico e na profusão de patrimônio histórico disponível. A perda desse status de capital foi responsável por uma profunda crise e depressão da área.
E mesmo embora após a constituição cidadã Niterói tenha retomado alguma capacidade de investir no Centro, esse passado de glória e de grandes prédios públicos ficou para trás até a retomada geral da auto-estima da classe média da cidade através do Caminho Niemeyer.
Estamos diante de desafio grave e similar. A mais grave crise econômica da história do Brasil já ceifou 1.300 vagas de emprego só no Centro e ainda antes do fim de 2019 - além da derrocada da indústria naval. Há vertiginoso aumento da população de rua e o sofrimento humano é verificável a olho nú. Embora tenham sido feitos investimentos locais, a dinâmica geral recessiva na economia ameaça o centro da cidade com um novo ciclo de decadência. Pelo menos 23,7% das lojas do centro fecharam as portas nos últimos cinco anos (Sindilojas-Niterói). A população residente, outro indício de vitalidade e prosperidade de uma região, vem caindo na contramão do crescimento em outras regiões da cidade.
Desta vez as armas de resistência são a educação e a cultura. É a oferta de universidades e o uso dos prédios culturais que tem mantido papel positivo e contra-cíclico, diante do duro cenário geral. A revitalização da Biblioteca Parque e do Liceu, as atividades incessantes do Teatro Popular, a vida cotidiana da Universidade Federal Fluminense e das particulares, Teatro Municipal, etc, trazem fluxo que alimenta o comércio, desenvolve renda e oferece contraponto ao momento delicado. Será necessário passar a ocupar praças ainda subutilizadas, revisitar as potentes comunidades populares do Centro com fomento cultural e projetos diversos para incrementar essa resistência ainda mais.
Mas, sobretudo, é necessário retomada da economia do país. Mesmo cumprindo importante papel, a cultura e a educação não podem sozinhas segurar uma região inteira e substituir a economia. Enquanto o atual governo federal tira direitos e toma medidas restricionárias no crédito e nos investimentos, o Centro de Niterói agoniza, com o freio de mão puxado impedindo o desenvolvimento econômico e o emprego. Uma revisão destas posturas é decisiva para Niterói - e para o país. Enquanto isso, são a cultura e a educação na linha de frente da resistência heróica do centro da cidade contra um segundo ciclo de decadência e escuridão.
*Leonardo Giordano é vereador de Niterói (PCdoB)