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Amazônia é fundamental para meta climática, diz Carlos Nobre

Elton Alisson, Agência Fapesp


Se for mantido o atual ritmo de desmatamento, degradação e queimada da Amazônia, algo entre 50% e 70% da floresta estará perdida entre 30 a 50 anos. E a meta do Acordo de Paris, de limitar o aquecimento global em 1,5 ºC até 2100, não será atingida.

Reprodução

A avaliação foi feita por Carlos Nobre, pesquisador aposentado do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e copresidente do Painel Científico para a Amazônia, durante mesa-redonda sobre o meio ambiente no Brasil na segunda-feira (25/7), na 74ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece até sexta-feira (30/7), na Universidade de Brasília (UnB).


De acordo com Nobre, estima-se que as florestas tropicais armazenem nas folhas, troncos e raízes mais de 400 bilhões de toneladas de carbono capturado da atmosfera, sendo que a maior parte está estocada na Amazônia.


Se entre 50% e 70% da floresta amazônica for perdida, a maior parte desse estoque de carbono retornaria para a atmosfera. Isso neutralizaria os esforços, previstos no Acordo de Paris, de reduzir a emissões de gás carbônico ao máximo de 400 bilhões de toneladas, somadas as emissões pela queima de combustível fóssil e as geradas pela agricultura e o desmatamento.


“Só a perda de 50% a 70% da floresta amazônica jogaria na atmosfera 300 bilhões de toneladas de carbono”, disse Nobre.

Carlos Nobre / USP

“Mesmo que, milagrosamente, conseguíssemos reduzir as emissões de CO2 pela queima de combustíveis fósseis até 2050, com a degradação da Amazônia e de outras florestas tropicais o aquecimento global atingiria 2,4 ºC”, afirmou o climatologista.


Nesse cenário a Amazônia se tornaria um bioma degradado, com poucas árvores e muitas gramíneas e arbustos, e a floresta perderia várias de suas funções, inclusive a capacidade de absorver carbono, disse Nobre.


“A floresta se restringiria a áreas próximas dos Andes, onde a estação seca é muito curta e os volumes de chuva são maiores”, explicou.


Estudos publicados recentemente indicam que algumas regiões da Amazônia, como o sul – que inclui Amazônia boliviana, Acre, Rondônia, sul do Amazonas, norte de Mato Grosso, sul do Pará e até o oeste do Maranhão –, estão prestes a atingir essa condição denominada pelo pesquisador de ponto de não retorno, ou tipping point (leia mais).


Para impedir esse processo é preciso estabelecer uma moratória para o desmatamento e degradação pelo fogo em toda essa região, zerar a derrubada da floresta até 2030 e implementar um programa de restauração de 1 milhão de quilômetros quadrados (km2) em todo o sul da Amazônia, apontou Nobre. O custo desse projeto é estimado entre US$ 30 bilhões e US$ 40 bilhões.


“Já há dúvidas na comunidade científica se vamos conseguir impedir o ponto de não retorno da Amazônia. Pessoalmente, acho que isso é possível se conseguirmos restaurar o sul da Amazônia. Dessa forma, a floresta conseguirá se regenerar”, avaliou.


Desenvolvimento sustentável


A restauração das áreas degradadas e a manutenção das áreas preservadas da floresta também são fundamentais para melhorar a qualidade de vida das populações amazônidas, apontou Carlos Joly, professor da Universidade Estadual de Campinas e membro da coordenação do programa BIOTA-FAPESP.


“Precisamos criar maneiras de melhorar a qualidade de vida dos 23 milhões de brasileiros que vivem na região e, ao mesmo tempo, preservar e transformar a floresta em um grande ativo, combinando conhecimentos das populações tradicionais e indígenas com o científico para identificar soluções que sejam viáveis, tenham escala e tragam uma mudança real de perspectiva”, disse Joly.


“Certamente haverá financiamento para trazer de volta o desenvolvimento para a região, mantendo e utilizando produtos da floresta”, afirmou o pesquisador, dando como exemplo iniciativa recente de apoio à pesquisa por meio do edital da iniciativa Amazônia+10, lançado pela FAPESP em parceria com fundações de amparo à pesquisa de outros 19 Estados do país (leia mais).


Na avaliação de Bráulio Dias, professor da UnB, o Brasil tem condições de ser um grande produtor mundial de alimentos e, ao mesmo tempo, líder na conservação e o uso sustentável da biodiversidade. Para tanto, é preciso a aplicação da ciência, apontou.


“Com o aumento da demanda de açaí, muitos produtores no delta da Amazônia começaram a cortar outras árvores próximas para deixar mais espaço para as palmeiras do açaí. Com isso, a produção do fruto caiu porque ele precisa ser polinizado por abelhas sem ferrão, que fazem ninhos em ocos de árvores. Isso é um exemplo da falta de assessoramento científico”, disse.


Apesar de ainda deter a maior biodiversidade do mundo, o país vem registrando perdas crescentes de espécies, ponderou o pesquisador.


“Felizmente a taxa de extinção é relativamente baixa no Brasil, mas o número de espécies reconhecidas como ameaçadas de extinção segue crescendo sem parar. E a extinção de espécies deve ser vista como o tipo mais grave de degradação ambiental porque, uma vez que são perdidas, não é possível recuperá-las”, ponderou.

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