Aras já arquivou 104 pedidos de investigação contra Bolsonaro

Escolhido a dedo por Bolsonaro para ser o chefe do Ministério Público Federal há quase três anos, a atuação do procurador-geral da República (PGR) Augusto Aras tem dado bom retorno político ao presidente. De acordo com um levantamento publicado em reportagem do UOL neste sábado (30), o órgão dirigido por Aras já arquivou nada menos do que 104 pedidos de investigação contra Jair Bolsonaro (PL). A lista de decisões favoráveis do PGR foi engrossada nesta semana ao se manifestar contra o avanço de sete apurações pedidas pela CPI da Covid.
Segundo a pesquisa, desde o início da atual gestão da Procuradoria-Geral da República, Bolsonaro foi alvo de 151 representações no Supremo Tribunal Federal (STF), sendo 131 notícias-crime (pedidos de investigação) e 20 interpelações judiciais, em geral cobrando explicações por declarações do presidente. Das 131 notícias-crime que chegaram ao STF, 17 foram descartadas pela própria Corte, devido a inadequações jurídicas. As demais se dividem entre as que Aras mandou arquivar (104) e as que ainda aguardam manifestação da PGR (10).
Juristas consultados pela reportagem destacam entre os casos arquivados as declarações golpistas do presidente durante o 7 de Setembro do ano passado, nas aglomerações promovidas por ele durante o pico da pandemia de covid-19, e no pronunciamento que fez, em junho deste ano, defendendo que os militares fiscalizem as eleições. Para os juristas, porém, a decisão de Aras de descartar algumas investigações foi equivocada. Para eles, houve episódios com margem de discussão sobre um possível crime de Bolsonaro mas em outros o delito ficou claro.
Até o momento, a PGR não apresentou nenhuma denúncia contra Bolsonaro. Em algumas situações, como na suposta prevaricação de Bolsonaro ao ouvir relatos de crimes sobre a compra da vacina Covaxin, Aras abriu um inquérito por uma ordem ministra Rosa Weber, do STF, que não aceitou o pedido de arquivamento. O caso, todavia, foi encerrado semanas depois, quando a PGR insistiu no arquivamento. Para Lenio Streck, este caso mostra uma "armadilha sistêmica" das instituições brasileiras, que seria o acúmulo de poder nas mãos do PGR sobre investigações com foro privilegiado. "Ele tem a última palavra para oferecer ou não a denúncia criminal. A palavra dele, na prática, acaba valendo mais que a do Supremo", diz, conforme UOL.
Quebra de tradição e afinidades
A escolha de Augusto Aras para o cargo quebrou uma tradição que vinha desde 2003, período em que o presidente da República escolhia um dos nomes da lista tríplice dos mais votados pelo MPF. A tradição é entendida como uma forma de manter a autonomia e força política do cargo.
É o PGR que exerce as funções do MP junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de poder propor ações diretas de inconstitucionalidade e pedir federalização de casos de crimes contra os direitos humanos e ações contra o presidente da República.
Aras é crítico da ideologia de gênero e da política de cotas raciais para ingresso em universidades e já chegou a apoiar a excludente de ilicitude para proprietários rurais que atirarem em invasores de suas terras - defende que eles não respondam criminalmente -, entre outras afinidades com pregações de Bolsonaro.