Covid-19 avança na Amazônia e mata 23 indígenas em regiões remotas
A Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) do Ministério da Saúde informou nesta segunda-feira (18) que pelo menos 23 indígenas morreram em decorrência da Covid-19. As vítimas viviam em terras indígenas remotas da Amazônia, 11 delas na região de fronteira com a Colômbia e o Peru. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), que contabiliza os casos de coronavírus entre indígenas que migraram para áreas urbanas e que não são tratados pelo Sesai, informou que houve 103 óbitos confirmados. Três quartos dos 540 casos confirmados de coronavírus pela APIB estão na Amazônia, onde a pandemia atingiu em cheio a cidade de Manaus, que foi a primeira do país a ficar sem leitos de UTI, enquanto seu principal cemitério enterra mortos em covas coletivas - segundo informou o site G1, que destacou que a covid-19 está se espalhando tão rapidamente entre os povos indígenas nas partes mais afastadas da Amazônia que os médicos estão agora transferindo de avião pacientes em estado grave para as únicas unidades de terapia intensiva na região.
Carta emergencial anuncia massacre
Neste domingo (17), lideranças indígenas divulgaram uma "carta emergencial dos Conselhos Guarani e Kaiowá frente à Pandemia da Covid-19", na qual anunciam que estão diante de um massacre em seus territórios, e apelam pela sobrevivência, pedindo ao governo o envio de pontos de apoio médicos para a região. O manifesto fala em nome dos cerca de 51 mil Guarani e Kaiowá, a segunda maior população indígena do Brasil, localizados no estado de Mato Grosso do Sul.
A carta, na íntegra:
"Nós, Conselhos tradicionais Guarani e Kaiowá Aty Guasu (assembléia Geral do Povo Guarani e Kaiowá), Kuñangue Aty Guasu (Grande Assembléia das Mulheres Guarani e Kaiowá), RAJ (Retomada Aty Jovem), Aty Jeroky Guasu (Assembleia geral dos Nhanderus e Nhandesys) viemos através desta carta anunciar que estamos diante de mais um massacre anunciado com a chegada do COVID-19 em nossos Tekohás (Territórios indígenas) e apelamos pela nossa sobrevivência. Somos aproximadamente 51mil Guarani e Kaiowá, a segunda maior população indígena do Brasil, localizados no estado de Mato Grosso do Sul, e nos encontramos em Estado de Emergência. São 520 anos de massacres, doenças que a violenta experiência de colonização nos trouxe no Brasil. Nos restam poucos anciões que guardam o conhecimento tradicional, a vida deles e da comunidade estão em risco, e junto a perda da história de um povo. Quem será responsabilizado pela morte do nosso povo? Em três dias de testes, a Reserva Indígena de Dourados (RID), a mais populosa do Brasil, hoje (16 de maio de 2020) confirmam 10 casos positivos de Coronavírus na comunidade. Todos os territórios Guarani e Kaiowá estão sob alerta montando barreiras sanitárias, bloqueando todos os acessos aos territórios. Os dados da Secretaria Especial de Saúde Indígena apontam casos suspeitos em vários territórios Guarani e Kaiowá, para além das “subnotificações” em todo o Brasil. As condições de moradia nas aldeias não permitem o isolamento domiciliar, favorecendo a transmissão em larga escala e rapidamente, e sendo a COVID-19, uma doença de alta letalidade precisamos urgentemente de pontos de apoio para isolamento dos pacientes confirmados. Estamos diante do maior DSEI (Distrito Sanitário Especial Indígena) do Brasil, e 70% dos usuários são Guarani e Kaiowá, e com o avanço do Coronavírus nas aldeias, de acordo com o boletim epidemiológico da SESAI, a cidade de Dourados com poucos leitos disponíveis, não terá suporte para tantos indígenas infectados. A Secretaria Especial de Saúde Indígena necessita de fortalecimento URGENTE para enfrentar essa pandemia. Os municípios encontram-se fragilizados, e mesmo assim o desejo do Governo Federal é de municipalização da saúde indígena. A situação do Covid-19 só demonstra a insuficiência dos municípios em dar conta da saúde dos povos indígenas em seus territórios, de forma que nem rede de urgência e emergência consegue disponibilizar nas aldeias mais distantes dos espaços urbanos. As redes de contato dos casos confirmados estão sendo avaliadas para rastreio e intervenção. O caso traz preocupação considerando que Dourados possui a maior população indígena deste grupo do Estado, totalizando 17,3 mil indígenas. Toda equipe de saúde está trabalhando para conter o avanço da doença, e a partir destes primeiros casos registrados o plano de ação da saúde indígena passa para a segunda etapa, na qual será feita ampla testagem na população indígena. A SESAI faz o cuidado específico em nível de atenção básica, necessitando de forma urgente da corresponsabilidade e compromisso dos demais níveis de atenção da rede SUS (Sistema Único De Saúde). Nós Aty Guasu, Kunangue Aty Guasu, RAJ e Aty Jeroky Guasu viemos solicitar o atendimento diferenciado especifico para indígenas, uma organização URGENTE da rede de urgência e emergência segura, respeitando as especificidades do nosso povo: ambulâncias, leitos, alternativas de isolamentos possíveis para a comunidade, proteção aos trabalhadores em contatos familiares, EPI’s e vagas em cemitérios. Todas doações de ajudas humanitárias de sobrevivência serão bem-vindas: alimentos, máscaras de três camadas de tecido de algodão, produtos de higiene para as comunidades, caixas d’aguas para armazenamento, e sementes para o plantio em nossas roças. Recomendamos a toda comunidade Guarani e Kaiowá que fiquem em seus Tekohas, que toda a liderança tenha a responsabilidade do bloqueio sanitário de todos os acessos de entradas aos territórios indígenas para manter a saúde do Povo Guarani e Kaiowá, permitindo apenas a entrada de trabalhadores da Saúde e ajudas humanitárias. Agradecemos cada apoio e cumprimentamos a todos os profissionais que estão a frente dessa Pandemia Coronavírus. Somos solidários (as) às todas as famílias em luto. Não é só uma crise de saúde, é o genocídio do nosso povo, é um tratamento desumano e racista contra as nossas vidas. É URGENTE! Pedimos SOCORRO! Att, ATY GUASU , KUNANGUE ATY GUASU, RETOMADA ATY JOVEM e ATY JEROKY GUASU."
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