Em Haia, Israel acusa África do Sul de 'distorcer' situação em Gaza
Os representantes de Israel negaram nesta sexta-feira (12), perante a Corte Internacional de Justiça (CIJ), em Haia, nos Países Baixos, a acusação da África do Sul de que praticam genocídio na Faixa de Gaza.
De acordo com os advogados israelenses, a denúncia é uma distorção do que acontece na Faixa de Gaza, e pediram ao tribunal que rejeite a solicitação sul-africana de determinar a suspensão das ações militares na região. Após sustentação oral da defesa de Israel, a presidente da Corte, Joan Donoghue, afirmou que o tribunal emitirá uma ordem “o mais rapidamente possível”.
O consultor jurídico do Ministério das Relações Exteriores de Israel Tal Becker disse que “a tentativa de transformar o termo genocídio contra Israel numa arma, no contexto atual, faz mais do que contar ao tribunal uma história grosseiramente distorcida, e faz mais do que esvaziar a palavra da sua força única e do seu significado especial. Subverte o objeto e a finalidade da própria Convenção [para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio]”.
A Convenção de 1948 caracteriza genocídio como atos “cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso”.
Para o advogado de Israel, a denúncia da África do Sul é “uma difamação destinada a negar a Israel o direito de defender-se, de acordo com a lei, do ataque terrorista sem precedentes que continua a enfrentar e libertar os 136 reféns que o Hamas ainda mantém”.
O representante do Ministério das Relações Exteriores de Israel apelou que a Corte rejeite o pedido de medidas cautelares para suspender as operações militares em Gaza. Segundo Becker, a suspensão da guerra colocaria Israel em risco.
“Isso equivale a uma tentativa de negar a Israel a sua capacidade de cumprir as suas obrigações de defesa dos seus cidadãos, dos reféns e de mais de 110 mil israelenses deslocados internamente, incapazes de regressar em segurança às suas casas”, afirmou.
Natureza do conflito
De acordo com Tal Becker, a África do Sul modificou a natureza do conflito que afeta o Oriente Médio desde o dia 7 de outubro. “O requerente pede essencialmente ao tribunal que substitua a lente do conflito armado entre um Estado e uma organização terrorista sem lei pela lente do chamado genocídio de um Estado contra uma população civil”, explicou.
Becker sustentou que Israel não pretende destruir o povo palestino, não tem intenção de ocupar permanentemente Gaza ou de forçar o êxodo da sua população, mas apenas de destruir o Hamas.
“O que Israel procura ao operar em Gaza não é destruir um povo, mas proteger um povo, o seu povo, que está sob ataque em múltiplas frentes, e fazê-lo de acordo com a lei, mesmo quando enfrenta um inimigo cruel determinado a usar esse mesmo compromisso contra ele”, destacou.
O representante de Israel ainda reclamou que a África do Sul “praticamente” ignorou o ataque do Hamas em 7 de outubro, que pode ser caracterizado como genocida. “Se houve atos que podem ser caracterizados como genocidas, então foram perpetrados contra Israel”, disse o advogado.
Becker ainda acusou a África do Sul de ter relações com o Hamas. “É do conhecimento público que a África do Sul desfruta de relações estreitas com o Hamas, apesar do seu reconhecimento formal como organização terrorista por numerosos estados em todo o mundo. Essas relações continuaram inabaláveis mesmo depois das atrocidades de 7 de outubro”, afirmou.
População civil
Na denúncia, a África do Sul afirma que Israel tem bombardeado a população civil indiscriminadamente. Mas segundo Tal Becker, o Hamas usa estruturas civis e humanitárias para atacar Israel.
“O tribunal é informado de danos generalizados a edifícios. Mas não é dito, por exemplo, quantos milhares desses edifícios foram destruídos porque foram armadilhados pelo Hamas. Quantos se tornaram alvos legítimos devido à estratégia de utilização de bens civis e locais protegidos para fins militares?”, questionou.
A advogada Khalid Raghwan, responsável por descrever as supostas ações de Israel para proteger a população civil em Gaza, disse que as Forças de Defesa de Israel (FDI) empregaram uma série de medidas para cumprir com o direito humanitário internacional.
“Por exemplo, fornece avisos antecipados eficazes de ataques sempre que as circunstâncias o permitam. É claro que isso não quer dizer que nada mais possa ser feito ou que não haja desafios à situação humanitária em Gaza. Tais desafios existem e mudam de acordo com a evolução das circunstâncias do conflito, mas isso significa que a acusação de genocídio face a esses esforços extensos é francamente insustentável”, argumentou.
África do Sul e Brasil
No dia 29 de dezembro, a África do Sul ingressou com uma ação na CIJ acusando Israel de praticar genocídio em Gaza devido às ações militares do país no enclave palestino. Nesta semana, o Brasil manifestou apoio à denúncia contra Israel.
Nesta quinta-feira (11), os representantes do país africano fizeram a sustentação oral da denúncia na Corte. Para o governo da África do Sul, o povo palestino segue sendo deslocado de suas terras à força, em um processo de colonização iniciado com a criação do Estado de Israel, em 1948.
“A impunidade de décadas por violações generalizadas e sistemáticas dos direitos humanos encorajou Israel na sua recorrência e intensificação de crimes internacionais na Palestina”, destacou o embaixador do país em Haia, Vizdomuzi Madonsela.
O governo brasileiro, através do Ministério das Relações Exteriores, manifestou na última quarta-feira (10) apoio à denúncia da África do Sul, na Corte de Haia, contra Israel por genocídio contra a população civil palestina na Faixa de Gaza.
23 mil mortes do lado palestino
Desde o começo das hostilidades entre Israel e Hamas, mais de 23 mil pessoas morreram e 7 mil estão desaparecidas. Dessas 23 mil, 70% são crianças e mulheres. Do lado israelense, há, ao menos, 1.139 mortos.
A África do Sul pós-apartheid há muito que defende a causa palestina, uma relação que começou quando a luta do Congresso Nacional Africano contra o governo da minoria branca foi apoiada pela Organização para a Libertação da Palestina de Yasser Arafat.
Espera-se que o tribunal decida sobre possíveis medidas de emergência ainda neste mês, mas não se pronunciará nesse momento sobre as alegações de genocídio. Esses processos podem levar anos. As decisões da CIJ são definitivas e sem recurso, mas o tribunal não tem forma de as aplicar.
Com Agência Brasil e Agência Sputnik
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