Enem: sintomas da pandemia no desempenho dos jovens
Por Ana Clara Paiva
A vida dos brasileiros mudou drasticamente durante a pandemia de covid-19. Para os jovens e adultos que se preparam para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) o impacto foi ainda maior. Esse período já é conhecido por ser bastante desafiador para os vestibulandos por conta da quantidade de conteúdos e técnicas cobradas nas provas. A alteração na rotina, a adaptação às aulas virtuais, a falta de suporte das escolas ou de dispositivos adequados para acompanhar o conteúdo e a falta de convivência com os amigos e professores são alguns dos problemas enfrentado por eles.
De acordo com a pesquisa “Juventudes e a Pandemia do Coronavírus” promovida pelo Conselho Nacional da Juventude (CONJUVE), em parceria com instituições como a UNESCO, 43% dos 68 mil jovens ouvidos disseram que já pensaram em parar de estudar desde que suas rotinas foram alteradas pela pandemia. Durante o ENEM do ano passado, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) registrou um número de abstenções superior a 50% nos dois dias de aplicação. Este foi o maior índice de abstenções desde 2009 quando a prova passou a ser obrigatória para o ingresso nas universidades.
A edição de 11 anos atrás recebeu mais de 4,5 milhões de inscrições, já a edição mais recente contou com 6.121.363 inscritos, de acordo com o MEC. Mais de oito mil candidatos pediram reaplicação da prova por apresentaram sintomas de doenças respiratórias.
Os números são preocupantes quando comparados com a prova de 2019 que registrou o menor índice de abstenção da história: dos 5.095.388 inscritos confirmados, apenas 1.385.579 não compareceram ao exame, ou seja, 27,19%.
Pensando no momento decisivo daqueles que irão se inscrever para o ENEM deste ano, o jornal Toda Palavra procurou jovens que irão prestar o exame para saber quais são as expectativas para a prova e quais as adversidades que estão enfrentando durante a preparação.
A estudante do ensino médio técnico Letícia Vitoria Carvalho, de 17 anos, contou que sua escola não se preparou para o ensino remoto no ano passado e neste ano ainda não tem uma organização adequada.
“Minha escola está fechada sem previsão de retorno, nossa única forma de contato é online. Às vezes temos aula, mas nem sempre. Toda semana a gente tem pelo menos uma. No início da pandemia nós não tínhamos muitas aulas e nem exercícios porque a escola não se organizou muito bem e os professores ficaram bem enrolados. Agora está um pouco mais organizado, mas poderia melhorar”, afirma Letícia.
A jovem conta que o atual formato desestimulou seus estudos e que seu aprendizado foi muito prejudicado.
“Não tenho conseguido me empenhar nos estudos, a falta de suporte da escola desamina. Mesmo quando passam atividades para os alunos nós não recebemos uma orientação. Meus colegas e eu buscamos tirar dúvidas na internet, mas não é a mesma coisa que ouvir as instruções dos nossos professores. Não temos videoaulas e nem outro tipo de material gravado pela escola, os professores não estão disponíveis para nós.”
Letícia diz que as atividades propostas pela escola não tem foco no exame nacional e relata a diferença do ensino antes da pandemia.
“O colégio passa exercícios que não servem para o ENEM. São somente para cumprir uma carga horária mínima e para termos alguma nota. Mas como as atividades não são obrigatórias e a gente faz sem suporte, muitos deixam de fazer. Quando estava tudo bem, minha escola era integral. Então, pelo menos eu passava o dia na escola inteiro estudando (em média 13 horas/dia). Em casa eu não faço isso. A rotina mudou completamente. Fico muito mais tempo parada só faço as atividades mínimas para não ser reprovada”, desabafa a estudante.
O aluno da 3ª série da rede privada, Júlio Cesar de Brito, de 17 anos, afirma que mesmo com a oferta do ensino híbrido pela sua escola, decidiu assistir as aulas remotamente para proteger sua família.
“Confesso que está sendo complicado. Como eu escolhi, por proteção, ficar no ensino remoto, tenho enfrentado problemas como a instabilidade da conexão com a internet” conta o estudante.
Júlio também relata que se mantém confiante com o exame nacional, mas que, apesar do suporte oferecido pela rede privada, ainda tem dificuldade em manter uma rotina de estudos.
“Minhas expectativas para o ENEM são boas. Acredito que com o material de estudos que o meu colégio está me proporcionando e com a minha rotina – que eu ainda estou tentando organizar, porque em alguns dias percebo que não consigo manter o ritmo – eu espero conseguir um bom resultado” afirma o jovem.
O adolescente fala que o que mais sente falta é da interação fora da sala de aula com professores e colegas, e que foi reduzida com o contato limitado às videochamadas.
“O que mais me atingiu no quesito dos estudos foi a falta de comunicação do professor com o aluno, que era mais forte antes da pandemia. Isso é extremamente importante para o aprendizado e também a interação com os colegas.”
Para a estudante da rede pública de ensino Kaylany Aguiar, de 18 anos, a ansiedade e a procrastinação foram algumas das coisas que mais afetaram sua rotina de estudos.
“A pandemia me fez passar por coisas que eu nunca imaginei passar. As notícias me causam angústia. Por isso, tive que mudar meus hábitos para tentar me motivar a estudar. Aprender pelo EAD não é muito fácil. É bem desconfortável ser aquela aluna que não está entendendo” relata Kaylany.
A jovem também demonstra pessimismo quanto ao desempenho no vestibular.
“Minha expectativa para o vestibular, para ser bem sincera, não é muito boa, pois muitas matérias eu ainda não consegui entender 'direitinho’. Mas estou fazendo o possível para reverter isso” afirma a estudante.
O ENEM 2021 iniciará o prazo das inscrições no próximo dia 30 e estará disponível até o dia 14 de julho através do site do INEP. A segunda edição durante a pandemia terá seus exames aplicados nos dias 21 e 28 de novembro, na versão digital e impressa.
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