Envolvimento suspeito de Flávio Bolsonaro em venda de fuzis

Uma reportagem exclusiva do UOL mostra indícios de favorecimento e conflito de interesses por parte do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) na compra de 500 fuzis pela Polícia Civil do Rio de Janeiro. A suspeita é que o filho 01 do presidente tenha favorecido a Sig Sauer, gigante da indústria bélica com sede nos EUA.
De acordo com a reportagem investigativa, a empresa venceu o pregão em julho de 2021 com a oferta de R$ 3.810.442,05 (2% abaixo do teto estipulado), mas a compra só foi concretizada cinco meses depois, quando Flávio conseguiu a liberação de R$ 3 milhões com a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), principal estrutura do Ministério da Justiça.
Especialistas argumentam que a licitação seria "viciada" e, por isso, deveria ser anulada. Fabricantes de armas ouvidos pelo UOL afirmam que houve restrições à concorrência no edital, já que os documentos técnicos possuíam uma série de detalhes que restringiriam a concorrência.
Ligações com o clã dos Bolsonaros
O inspetor da Polícia Civil fluminense, Manoel Hermida Lage, que colaborou com a parte técnica da licitação, trabalha para a Sig Sauer. Ele atua como instrutor do campo de tiros da fabricante no Brasil e teria sido o responsável por colocar as restrições no edital.
É de conhecimento público que a Sig Sauer já recebeu uma série de manifestações de apoio da família Bolsonaro para seus negócios no Brasil. No mercado de armamento pesado, é corrente o discurso de que o clã presidencial, principalmente o 01, Flávio, e o 03, Eduardo, defende os interesses da empresa.
Marcelo Costa, que está à frente da Sig Sauer no Brasil, também estaria envolvido nas irregularidades. Segundo as fontes do UOL, Costa usa os nomes de Flávio e Eduardo Bolsonaro como forma de abrir portas em órgãos públicos.
Além disso, ele seria bastante íntimo de Lage, que o acompanha em reuniões para apresentar as armas da Sig Sauer a outras corporações policiais no país, auxiliando nas vendas. O policial participou, inclusive, de encontros com representantes da Polícia Militar de Minas Gerais; das polícias Civil e Militar do Ceará; assim como da Polícia Civil e da Superintendência da Polícia Federal do Paraná.
A Polícia Civil do Rio nega ter favorecido a Sig Sauer e alega que a licitação foi auditada por órgãos públicos. Procurados, Flávio Bolsonaro e o governador do Rio, Cláudio Castro (PL), não se manifestaram sobre a intermediação para a liberação dos recursos.
Traficante "colecionador"
O Brasil vem registrando recordes no número de novas armas em circulação desde 2019. As ações do governo, que desde a posse do presidente Jair Bolsonaro facilitaram extremamente o acesso a elas, incrementaram o consumo de armamentos.
Na semana passada, Vitor Furtado Rebollal Lopes, conhecido como Bala 40, de 35 anos, foi preso em Goiânia. Ele utilizava aplicativos de mensagens para vender armas. Na casa dele, no Grajaú, bairro de classe média na Zona Norte do Rio, foram apreendidos 26 fuzis, 21 pistolas, dois revólveres, três carabinas, uma espingarda e um rifle, totalizando 54 armamentos, além de grande quantidade de munição. De acordo com os investigadores, o suspeito se aproveitava de ter registros como colecionador e atirador esportivo para adquirir as armas legalmente e revendê-las à maior facção criminosa do estado.
A arma alemã que matou Marielle
Foi uma submetralhadora MP5 da fabricante alemã Heckler & Koch, modelo de uso restrito no país, que em março de 2018 matou a vereadora Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes, no centro da cidade do Rio de Janeiro. Meses depois, em agosto daquele ano, a fabricante, conhecida popularmente como H&K, anunciou a decisão de não vender mais armas para o Brasil. O que guiou a decisão foi a agitação política anterior às eleições presidenciais e a violência policial no Brasil, segundo reportou a Deutsche Welle.
À época, um porta-voz da H&K disse à Agência Pública que a empresa preferiria perder negócios a ver suas armas cair nas mãos erradas. “Nossas armas pertencem às mãos certas. Com isso queremos dizer soldados e policiais de democracias liberais que compartilham do nosso sistema de valores liberais, combinado à lei e ao cumprimento dos direitos humanos universais”, disse o porta-voz, fazendo referência ao código de conduta da empresa.
