O triste fim do coronel Moreira César
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O triste fim do coronel Moreira César

Por Luiz Fernando Conde Sangenis*


Os niteroienses, em diversas ocasiões ao longo do tempo, viram-se instados a modificar o nome de uma das principais ruas de Icaraí que leva o nome do controvertido militar do Exército Brasileiro, o coronel Moreira César. A nova tentativa de alterar o nome da rua que abriga estabelecimentos comerciais sofisticados da cidade foi iniciada por diversos agentes políticos de Niterói, um dia após a morte do ator Paulo Gustavo, em consequência de complicações da covid-19. Entre eles, o prefeito Axel Grael, nesta quarta-feira (5), declarou em suas redes sociais o desejo de ouvir a população para definir a melhor forma de eternizar o amor recíproco entre Niterói e o ator. Decidiu abrir uma consulta pública, através do Colab, para a troca do nome da Rua Coronel Moreira César para Rua Ator Paulo Gustavo.

E quem foi o coronel Moreira César?

Antônio Moreira César nasceu em 7 de julho de 1850, na cidade de Pindamonhangaba, SP. Moreira César começou a se destacar na carreira militar desde muito cedo. Tornou-se personagem marcante em diversos episódios da história do Brasil, participando ativamente, ao lado do Exército Brasileiro, na Revolta da Armada (1893-1895) e na Guerra de Canudos (1896-1897), no sertão da Bahia, onde acabou ferido de morte. Niterói, chamada de "Cidade Invicta", sede da esquadra nacional, sofreu sobremaneira as consequências das ações de Floriano, de modo que foi violentamente bombardeada por meses.

O primeiro destaque na carreira militar de Moreira César aconteceu, em 1883, quando, aos 33 anos de idade, com a patente de capitão, assassinou pelas costas Apulcro de Castro, redator do jornal Corsário. O episódio foi descrito por Euclides da Cunha em seu livro "Os Sertões". Na obra, o autor detalha o momento da morte do jornalista. No Rio de Janeiro, o jovem capitão executou o jornalista com uma faca quando estava ao lado de um comandante de alta patente do exército. Depois do episódio, Moreira César foi transferido para o Mato Grosso. Segundo Euclides da Cunha, deixou a sua Sibéria brasileira após a proclamação da República.

Em 1891, no posto de tenente-coronel, Moreira César envolveu-se na derrubada do presidente da Bahia, José Gonçalves da Silva. O protagonismo do coronel fez com que fosse chamado a ocupar o cargo de chefe de polícia do Estado, função que desempenhou por menos de um mês.

Em 1892, tomou posse como comandante do 7º Batalhão de Infantaria, embarcando para Niterói, quando se registrava uma revolta do corpo policial.

Sua atuação cresceu, principalmente, a partir do governo Floriano Peixoto. Convocado pelo próprio Presidente da República, em Santa Catarina, foi o promotor de um “ajuste de contas”, segundo a definição do historiador Oswaldo Rodrigues Cabral, em perseguição aos rebeldes que lutavam no movimento da Revolução Federalista contra o governo de Floriano. Moreira César passou a integrar o grupo paramilitar, liderado por Gumercindo Saraiva, responsável pela vingança contra os militares da Marinha e seus simpatizantes organizadores da Revolta da Armada.

Entre as práticas contra os federalistas, uma das mais comuns era a decapitação dos seus prisioneiros. Moreira César era a principal referência da aplicação de métodos tão cruéis, recebendo, então, o apelido de "corta-cabeças" e "terra-treme". Além disso, ficou conhecido entre os colegas como "frio e calculista", em razão da sua falta de empatia com os seus inimigos e seus familiares.

O grupo do qual fazia parte foi responsável pela execução de centenas de pessoas, muitas delas jamais passaram por tipo algum de julgamento ou investigação antes de serem penalizadas com a morte.

Episódio marcante e derradeiro da fatídica carreira de Moreira César ocorreu na guerra de Canudos, movimento social, de cunho religioso, liderado pelo beato Antônio Conselheiro. O arraial de Belo Monte, popularmente conhecido por Canudos, reuniu milhares de sertanejos, no sertão da Bahia, criando uma comunidade autossustentável e independente do governo republicano. A organização dos sertanejos ameaçou os poderes políticos locais, ensejando uma campanha de difamação que tomou repercussão nacional, graças ao largo destaque na imprensa da época. A República nascente, sentindo-se ameaçada, organizou várias campanhas militares para por fim ao movimento popular que ameaçava a ordem instituída, pretenso fruto da ignorância, da patologia social e da sublevação dos pobres.

Após duas expedições militares fracassarem contra os seguidores do Conselheiro, o presidente interino do Brasil, na época Manuel Vitorino, que estava no lugar de Prudente de Morais, nomeou o coronel Moreira César para chefiar a terceira campanha militar contra Canudos.

O coronel então partiu para a Bahia, chegando em Canudos no dia 2 de março, liderando uma tropa de mil e trezentos homens, equipados com seis canhões Krupp, além de médicos, engenheiros militares, e um comboio que trazia as munições de guerra.

Na manhã do dia seguinte, Moreira César declara um ataque imediato ao arraial. Há quem diga que convocou a tropa para um almoço em Canudos. O combate, no entanto, foi difícil para ambos os lados, e o exército foi obrigado a recuar, diante dos tiroteios intensos que recebia dos nacionais transformados à condição de jagunços e inimigos da pátria.

Assim como as anteriores, a expedição de Moreira César não foi o bastante para combater os rebeldes de Canudos. A história registra que, após quase cinco horas de luta, o coronel foi atingido no ventre, causando um grave ferimento que lhe tiraria a vida horas depois.

Os niteroienses, ante os fatos narrados, têm renovada condição de decidir sobre o patrono da rua: o alegre ator e humorista, nascido na cidade, Paulo Gustavo, ou o coronel que se confunde entre conceitos distintos de herói ou facínora.


*Luiz Fernando Conde Sangenis é professor, professor e profundo conhecedor da obra de Euclides da Cunha. Formado em Filosofia pela UERJ e em Pedagogia pela UFF, é mestre e doutor em Educação também pela UFF, com período de doutorado sandwich na Universidade de Évora (Portugal) e pós-doutorado em História da Educação na UNICAMP. É professor Associado e Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação - Processos Formativos e Desigualdades Sociais, na Faculdade de Formação de Professores da UERJ.


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