Por que Forças Armadas do Brasil não se beneficiam do BRICS
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Por que Forças Armadas do Brasil não se beneficiam do BRICS


(Foto: Sputnik/ Mikhail Metzel)

Já fazem algumas décadas que paira sobre as Forças Armadas do Brasil (FA) um importante questionamento: o preconceito ideológico pode ser encarado como fator relevante para frear o desenvolvimento da Defesa nacional? Especialista em gestão estratégica explica por que o Brasil tem poucos acordos no setor militar com as potências do BRICS.

Dado o comprometimento do Itamaraty com a longevidade das parcerias comerciais consolidadas com os países-membros do BRICS, parece lógico que as FA poderiam também se beneficiar da aliança e dos laços com potências militares e tecnológicas como Rússia e China na indústria de defesa. Mas por que essa oportunidade não é suficientemente explorada, com o objetivo de garantir o pleno desenvolvimento das forças brasileiras?

Para Adriana Aparecida Marques, professora do curso de Defesa e gestão estratégica internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o principal problema que atrasa uma forte cooperação militar do Brasil com Moscou e Pequim são os dogmas ideológicos no alto escalão das FA. Ela enfatiza que, embora a Rússia não seja um país comunista, como a China, o Exército brasileiro, por seu passado anticomunista ao longo das últimas décadas, prefere um alinhamento a países apoiados pelos EUA.

De acordo com Marques, para compreender a questão, é preciso "voltar um pouco no tempo e pensar nessa cooperação [com a China, principalmente] a partir da política externa no Brasil". Ela lembra que o governo brasileiro da década de 1970, a partir de Ernesto Geisel, levou o país a "procurar parcerias com países em desenvolvimento, como a China. E qual era a grande demanda desses países? O acesso às tecnologias de ponta. Esse era o grande debate da época".

Ela aponta que a maioria dos países em desenvolvimento não tinha acesso às tecnologias de ponta. "A Rússia, é claro, não estava nessa discussão, embora a China sim. Desde o fim da ditadura existe uma aproximação entre Brasil e China. A partir do processo de redemocratização, o país começa a discutir parcerias estratégicas, principalmente com países do Hemisfério Sul. A cooperação com a China começa ainda durante a ditadura e tem um aprofundamento nas décadas de 1980 e 1990."



Ela lembra que "nos anos 1980, Brasil e China buscavam unir esforços para dar um impulso em seus programas espaciais. Como potências emergentes, viam na cooperação uma oportunidade de dinamizar um setor estrategicamente importante, cuja concepção dual permitia benefícios às indústrias civil e militar. Unindo recursos financeiros e tecnológicos, buscavam romper o bloqueio das nações desenvolvidas à transferência de tecnologias avançadas". Segundo ela, por conta dos "embargos e a visão negativa dos EUA com relação a essa parceria, esse processo foi interrompido".

De lá para cá, os programas espaciais dos dois países evoluíram em ritmos diferentes. A China desenvolveu os modernos veículos lançadores Longa Marcha e enviou diversos satélites e missões tripuladas ao espaço. O país inaugurará uma estação espacial própria neste ano e pretende enviar um homem à Lua e uma sonda a Marte nos próximos anos. O Brasil, por sua vez, enfrentou alguns percalços no seu programa espacial, embora tenha visto o primeiro brasileiro, Marcos Pontes, ir ao espaço.

Para Adriana Marques, "não é preciso reinventar a roda, basta retomar algumas políticas do Brasil com base no pragmatismo". Ela relatou que, nas últimas décadas, o envolvimento com a indústria de defesa russa foi pouco aproveitado porque havia uma "barreira ideológica", claramente "anticomunista". Ela entende que as FA "desejam um alinhamento com os EUA, possivelmente um aliado extra-OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte]. Para além do preconceito ideológico com as tecnologias chinesas e russas, há sobretudo uma definição entre os militares brasileiros de que o Brasil faz parte do Ocidente e é um aliado natural dos EUA. Isso é muito forte".

O fato é que, em 2013, quando o Brasil decidiu adquirir caças Gripen da empresa sueca Saab, uma das razões alegadas para a decisão foi o fato de a Suécia não ser membro da OTAN. Em 2019 isso mudou, e o Brasil foi designado um "parceiro preferencial extra-OTAN" dos Estados Unidos. Para conseguir essa designação, com o apoio dos EUA para ingressar na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil abriu mão do status de país em desenvolvimento na Organização Mundial do Comércio (OMC).

Novos caças suecos Gripen comprados pela Força Aérea Brasileira (Foto: Agência Brasil)

A dependência das Forças Armadas do Brasil dos equipamentos fornecidos majoritariamente por países da OTAN é antiga. A organização foi criada em 1949, no contexto da Guerra Fria. Em 1952, o Brasil firmou um acordo de cooperação militar com os Estados Unidos que, segundo especialistas, acabou levando a um atraso tecnológico militar brasileiro, pois o país passou a ter acesso a equipamentos obsoletos a baixo custo, deixando a produção local em segundo plano.

Foi apenas em 1977 que o governo militar, na gestão Geisel, rompeu com o acordo, alegando o evidente sucateamento dos equipamentos do Exército brasileiro. A estratégia de criar sua própria indústria nos anos seguintes esbarrou nas dificuldades da modernidade e da globalização: as gigantes do setor militar tinham regras "complicadas" para a transferência de tecnologia e uso de patentes. É importante ressaltar também que as FA adotam o Sistema OTAN de Catalogação (SOC) desde 1972 para atender o gerenciamento de suprimentos.

Em 2013, o Brasil comprou da Alemanha, outro país-membro da OTAN, 34 blindados antiaéreos Gepard 1A2 usados, alegadamente usados para defesa antiaérea na Copa das Confederações, visita do papa Francisco, Copa do Mundo e Olimpíadas. Em março deste ano, o Brasil tentou se associar ao centro de defesa cibernética da OTAN. O setor cibernético é elencado na Estratégia Nacional de Defesa (END) como um dos três estratégicos para o Brasil e é atribuído prioritariamente ao Exército. Os outros dois setores são o nuclear (Marinha) e o espacial (Força Aérea).

Ainda há tempo para salvar o BRICS

Para a professora da UFRJ, "o que precisa mudar são essas compras, essas aquisições militares; elas são pautadas por uma lógica de política externa e percepções das Forças Armadas. Os novos generais não investem em ciência e tecnologia, eles querem comprar os produtos prontos. Não existe uma relação entre as aquisições das FA e a demanda do Brasil. Os tanques Leopard, da Alemanha, são para uma guerra convencional, e não para a visita do papa. O que o Brasil precisa é desenvolver seu projeto espacial, que não teve apoio dos militares, que fizeram pouco para salvar o projeto. A China seria fundamental nesse sentido".

Nesse contexto, ela também comentou a recente polêmica envolvendo mísseis Javelin dos EUA, que também fazem parte do arsenal da China. Ela lembra que o Brasil fez questão de comprar o equipamento com os norte-americanos, que impuseram uma série de restrições para venda de equipamentos de guerra. Para Marques, para fugir disso, é preciso "seguir o caminho dos europeus, que é todo compartilhado. Quando se faz isso, já se cria um mecanismo de confiança. Mas, para isso, temos que entender qual é o papel das Forças Armadas, que certamente não é fiscalizar urnas e misturar-se com a vida política".

"O país precisa de Forças Armadas que queiram investir em tecnologia, pois discutir o papel das FA é debater o que queremos como país. É preciso resgatar um projeto que seja nacional. O Brasil tem um território enorme, que precisa de proteção, principalmente na defesa de sua população e de suas riquezas. E há a questão da cooperação regional, porque isso é fundamental. Não se discute Amazônia a nível nacional. É preciso discutir com os nossos parceiros regionais, inclusive a Venezuela", afirma a especialista.

A aquisição pelo Brasil de equipamentos mais sofisticados, como carros de combate, blindados, aviões de combate e navios de guerra, produzidos na Rússia e na China esbarra na cultura operacional militar brasileira, que ao longo de décadas se acostumou com o uso de equipamento ocidental. As Forças Armadas brasileiras já chegaram a adquirir equipamentos de origens russa e chinesa, como helicópteros, mas ainda em quantidades limitadas. Um exemplo é o míssil antiaéreo lançado de ombro Igla-S, usado pelo Exército brasileiro e pela Força Aérea Brasileira (FAB).


Fonte: Agência Sputnik

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