"Sem querer querendo", América Latina cala Chaves
Em plena pandemia de Covid-19, as telas de toda a América Latina já não vão mais exibir uma das estrelas que uniu gerações.
Uma disputa comercial sobre os direitos de autor entre o conglomerado de mídia mexicano Televisa e os herdeiros do roteirista e protagonista de "Chaves" e "Chapolin Colorado", Roberto Gómez Bolaños, impede a transmissão dos memoráveis capítulos dessas séries, presentes na memória de muitas gerações.
O humor de Gómez Bolaños já não pode ser visto em nenhuma parte, depois de 47 anos entretendo toda a América Latina com uma linguagem infantil e inocente, contando a história de um pequeno bairro pobre mexicano, com personagens que poderiam ser de uma rua de qualquer país da região.
Disputa por um acordo
A família de Gómez Bolaños criticou a falta de um acordo que possibilitaria a retransmissão dos programas, que durante os últimos anos era realizada pela cadeia Televisa, e contava com vários contratos de difusão, entre eles com a rede SBT, no Brasil.
Estima-se que os programas de Gómez Bolaños, que deixaram de ser produzidos nos anos 1980, possuíam entre 75 e 125 milhões de telespectadores em toda a América Latina, onde eram assistidos em espanhol, português e inglês.
Os programas têm enredos com personagens centrais, como o Chapolin Colorado, um anti-herói trapalhão que sempre acaba triunfando graças à sua inesperada sorte.
Por outro lado, o personagem Chaves representava um menino que morava na rua, que era humilde, forte e, no fundo, gentil e inocente.
"Ninguém tem paciência comigo" era um dos seus bordões, que utilizava quando chegava cansado ao final de seus argumentos em uma humilde vizinhança habitada por várias famílias, mas com um pátio comum, onde tudo acontecia.
A Televisa e a família Bolaños, herdeiros do comediante que faleceu em 2014, não chegaram a um acordo sobre o valor dos direitos de transmissão e licenças de produção de novas séries baseadas nos personagens criados por Roberto.
'Dona Florinda': "Agressão às pessoas"
Em seu Twitter a atriz Florinda Meza, a Dona Florinda de "Chaves", uma das protagonistas da série e viúva de Bolaños, comentou a polêmica:
O que eu penso sobre parar a transmissão do programa Chespirito? Embora eu não tenha nada a ver com isso porque inexplicavelmente não fui chamada para as negociações, creio que, justo agora quando o mundo mais precisa de diversão, fazer isso será uma agressão às pessoas.
Um Chaves envelhecido
Fernando Bonilla, ator e diretor de programas de televisão, disse à Sputnik Mundo que a conjuntura do cancelamento da transmissão dos episódios antigos poderia levar a uma necessária reavaliação dos conteúdos.
"Devemos entender que como sociedade nos renovamos e que se renovou o conteúdo televisivo que consumimos", salientou Bonilla, em referência às mudanças que a sociedade mexicana passou nos últimos anos.
O ator concorda com uma retirada do conteúdo violento dos programas, assim como atitudes machistas e discriminatórias, que eram consideradas "inocentes" ou "humorísticas" no século passado, mas que agora já não são aceitáveis.
"Devemos procurar entregar a nossos filhos e adolescentes produtos de qualidade que gerem diversão, mas nos quais também se apele à inteligência, e que sirvam como desafios e alimentem suas capacidades perante a sociedade que terão que enfrentar", acrescentou o dramaturgo.
A necessidade de uma revisão do conteúdo, sem censura, poderia gerar uma reflexão sobre as mudanças da sociedade latino-americanas, refletidas na televisão, avaliam muitos.
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