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Desvalorizados, professores orgulham-se da profissão

Entre 2005 e 2014, o Brasil viveu um período de conquistas para estudantes e profissionais da educação. O Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), criado em 2007, garantiu recursos para o pagamento dos salários de professores, de creches até o ensino médio, e permitiu a elaboração da Lei do Piso, em 2008.

Foto: Wilson Dias / Agência Brasil

O Plano Nacional da Educação (PNE), de 2013, estabeleceu metas, como a licenciatura para atuar na educação básica e a necessidade da educação continuada, aumentando o grau de qualificação dos docentes. Houve, ainda, a equiparação do salário dos professores a outros profissionais com mesma formação e carga horária, além do plano de cargos e carreira, tendo o piso como referência.


Tudo mudou, porém, a partir do golpe de 2016, com a chegada de Michel Temer à presidência, quando a educação brasileira sofreu um grande impacto negativo. O corte nas bolsas de Iniciação Científica (IC) e de pós-graduação, foi aprofundado pela Emenda Constitucional 95, que proíbe novos investimentos em políticas públicas — entre elas, a educação — até 2036. Com Bolsonaro, vieram mais cortes no ensino público e na pesquisa científica, assim como foram suspensos os reajustes dos professores e as melhorias previstas para a categoria.


Bolsonaro trouxe com ele a negação ao conhecimento, à ciência, ao aprendizado. E o desprezo pelos professores. Sua necessidade (e de seus apoiadores) em desmerecer o legado de Paulo Freire é um bom exemplo disso. Com a nomeação de três ministros ideologicamente alinhados, o governo segue com a política de desmonte. O atual dirigente da pasta, o pastor Milton Ribeiro, que sucedeu Abraham Weinbraub, resumiu bem a mentalidade obscurantista que está por trás de toda a inação de seu ministério, quando disse recentemente que no Brasil "universidade tem que ser para poucos".


Milton Ribeiro, que não é docente, defende o ensino domiciliar, a privatização das universidades públicas, as escolas cívico-militares e, provavelmente a 'escola sem partido', invenção da extrema-deireita alemã copiada por bolsonaristas. O papel do professor e da educação na construção de um país justo e inclusivo passam longe dos objetivos do presidente e seus comandados.

Professores se reinventam para dar aulas remotas / Foto: Reprodução, TV Brasil

Pandemia e reajuste de salário


Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), avalia que é muito grande o impacto da pandemia sobre os professores.


"Há muita tristeza na categoria. Para se ter uma ideia, no último dia 5, a Internacional da Educação comemorou o Dia Mundial do Docente. E para isso pediu às confederações pelo mundo vídeos em homenagem aos que faleceram por conta da covid-19. A CNTE fez um vídeo muito triste, já que muita gente próxima dela partiu, infelizmente, por conta da covid-19. Dos que ficaram, adoeceram muitos e 74% da nossa categoria – professores e professoras – tiveram doenças profissionais devido à falta de condições adequadas para atividade remota. Perdemos muitos estudantes e isso traz também um impacto muito grande na vida profissional e pessoal desses professores. Muitos se esforçaram para manter a atividade remota, alguns foram atrás até de equipamentos para emprestar aos estudantes para manter o processo de interação, e houve uma intensificação do nosso trabalho”, conta ele.


Apesar do empenho dos professores, a falta de formação e de equipamentos adequados, assim como as dificuldades de conexão à internet, desencadearam muitas doenças como a depressão. Heleno diz que muitos docentes tiveram a saúde mental afetada por não conseguirem realizar as atividades remotas a contento, se sentndo frustrados e impotentes. Segundo ele, os governos não investiram nem na infraestrutura das escolas para garantir o retorno seguro, nem na conexão.


Heleno Araújo / Foto: CNTE

“O próprio governo federal negou repasse de recursos de R$ 3,5 bilhões aprovados pelo Congresso. E foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela inconstitucionalidade dessa lei”, observa ele.


A questão salarial, na opinião do líder sindical, é outro fator que compromete o bom desempenho dos professores. Ele ressalta que desde o governo Temer houve queda no orçamento da educação, que vai sendo reduzido a cada ano.


"A meta 20 do PNE, que apontava a ampliação desses recursos até 2024, chegando 10% do PIB, foi inviabilizada. Com a EC 95 houve a redução no orçamento da educação, e essa redução trouxe a estagnação para as políticas do setor. Fora isso, nós tivemos uma redução agora em 2021, a primeira desde 2008 para cá, já que não foi aplicado o reajuste ao piso salarial”, explicou.


Conforme o dirigente, tratou-se de um golpe, via Portaria Interministerial número 3, de 26 de novembro de 2020, dos ministérios da Economia e da Educação. Segundo as pastas, estados e municípios tiveram redução de 8,7% da arrecadação – “o que não é verdade”.


“Isso foi desmascarado recentemente, em 24 de setembro, por meio de portaria determinando reajuste de 31,3% do custo aluno/ano para o Fundeb neste ano, lembrando que esse percentual é o mesmo que reajusta o piso salarial. Há uma previsão de reajuste do piso do magistério para o ano que vem de 31,3%, já que acumulou 2021, que não teve reajuste, e 2022 que terá esse reajuste conforme a legislação se for aplicada de forma adequada. Então, os golpes foram quebrando a possibilidade de aplicação do que conquistamos nas leis nos anos anteriores”, afirmou.

Foto: Reprodução / Twitter

Falta de reconhecimento


O Instituto Península lançou este mês a pesquisa inédita "Valorização da carreira docente: um olhar dos professores". Com o objetivo de ouvir os educadores para saber como está o seu nível de satisfação e compreender como se sentem em relação à profissão, o estudo ouviu mais de 1,1 mil educadores de todas as regiões do país entre 17/09 e 05/10.


Os dados revelam que quase todos que participaram do levantamento (97%) reconhecem que exercem um papel importante para a transformação social do país e na vida dos alunos, e 9 em cada 10 afirmam que sentem orgulho em falar que são professores. Além disso, a maioria se sente motivada (68%), realizada profissionalmente (69%) e respeitada pelos colegas de profissão (80%).


Ainda que se sintam motivados e orgulhosos de seu ofício, 77% dos professores acreditam que sua profissão não é valorizada no Brasil e 74% afirmam que não são respeitados pela sociedade em geral. Apesar disso, a maioria não se arrepende de ter escolhido a profissão docente (66%) e a recomenda como carreira para seus alunos (66%).


Na visão dos professores, para se sentirem mais valorizados, é necessário a melhoria da carreira (99%) e das condições de trabalho (99%). Ainda que 82% entendam que não ganham de acordo com a complexidade da profissão, a remuneração não é vista como um aspecto principal para que se sintam valorizados.


Com base nas respostas recebidas na pesquisa, o Instituto Península calculou a média de satisfação com a profissão docente no Brasil. Pouco menos da metade (47%) dos professores estão satisfeitos com a profissão - e é interessante notar que, quando se divide os respondentes por rede de ensino, as melhores notas de satisfação foram apontadas por professores da rede municipal (6,2), seguidos pela rede privada (5,8) e, por fim, a rede estadual (5,3).


E quando se divide os respondentes por níveis de ensino, as melhores notas foram dadas por professores da Educação Infantil (6,5), seguidos dos anos iniciais do Ensino Fundamental (6,0), anos finais do Ensino Fundamental (5,8) e, por fim, Ensino Médio (5,7). A pesquisa chegou a um Net Promoter Score (NPS) de -29,8. Considerando uma régua de satisfação que vai de -100 a + 100, isso significa que o NPS da carreira docente no Brasil está numa "zona crítica".


"Essa pesquisa ajuda a evidenciar aspectos interessantes que fogem do senso comum quando se pensa na profissão docente, como a questão da remuneração e do orgulho. Só conseguiremos verdadeiramente melhorar a Educação no nosso país se ouvirmos sistematicamente e darmos voz a quem está na linha de frente, os educadores, propondo soluções baseadas em evidências e acolhendo o que eles precisam", afirma Heloisa Morel, Diretora Executiva do Instituto Península.

Foto: Reprodução / TV Brasil

Para celebrar o Dia dos Professores e chamar a atenção da sociedade para a importância da valorização dos educadores brasileiros, o Instituto Península realiza, em parceria com a Secretaria de Estado dos Transportes Metropolitanos, a exposição "Educação à Flor da Pele". Os passageiros podem conferir a mostra gratuitamente a partir do dia 15/10 (sexta-feira) na plataforma da estação Santa Cecília, da linha 3-Vermelha do Metrô.


A exposição apresenta cinco professores, um de cada região do país, em fotografias inéditas, nas quais cada um deles teve uma palavra "tatuada" com tinta removível no próprio corpo, representando as palavras que os educadores de todo o país mais desejam para a profissão, segundo a mesma pesquisa: valorização, reconhecimento, respeito, amor e carreira.


"Queremos sensibilizar as pessoas para o papel fundamental que o professor exerce na sociedade. Eles são o pilar que sustenta a Educação ao entrarem todos os dias nas milhares de salas de aula do país para garantir uma aprendizagem de qualidade para nossas crianças e jovens. Precisamos entender que valorizar o professor é multiplicar o futuro", finaliza Heloisa Morel.


A pesquisa completa está disponível para download gratuito no site do Instituto Península.


*Com informações do Brasil de Fato e do Instituto Península







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