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Trens no Rio de Janeiro: o caos nosso de cada dia

Por Waldeck Carneiro*


Instalada na ALERJ em fevereiro do corrente, a CPI dos Trens, presidida pela Deputada Lucinha (PSD), cuja relatoria está sob minha responsabilidade, vem aprofundando a investigação sobre inúmeros problemas do transporte ferroviário de passageiros na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. São problemas que frequentam diariamente o noticiário e afetam gravemente o cotidiano da população trabalhadora que usa diariamente os trens no RJ: atrasos constantes, interrupção de serviços, falta de acessibilidade e banheiros em cerca de 2/3 das estações, distâncias perigosas entre vagão e plataforma, entre os mais comuns.

Mesmo com serviços tão precários, estava programado, para o início deste ano, um aumento de 40% na passagem (de R$ 5 para R$ 7), o que foi contido pelos trabalhos e pela firmeza da CPI. Não apenas aquele percentual é incompatível com o quadro de pobreza e desemprego que assola o RJ e com o poder aquisitivo de trabalhadores usuários de trens (quem teve aumento salarial de 40% nos últimos 12 meses?), bem como é inaceitável em face da qualidade dos serviços prestados pela concessionária, pessimamente fiscalizados pela autoridade estadual, que é o Poder concedente.

Sobre a concessão, dois aspectos logo chamaram a atenção da CPI. Por um lado, o indexador fixado no contrato de concessão para a revisão tarifária é o IGPM, diretamente vinculado às oscilações do dólar. Ora, para grande parte das contas públicas no RJ, usa-se o IPCA, inclusive para a revisão salarial de trabalhadores, quando isso acontece (no RJ, o governador Cláudio Castro se recusa a fazer a majoração do salário mínimo regional há dois anos). A rigor, o melhor indexador da revisão tarifária no transporte público deveria ser o percentual de revisão do salário dos trabalhadores. De toda forma, a CPI certamente apontará, em seu relatório final, a necessidade imperiosa de modificar a referência para o aumento do valor da passagem dos trens, que não pode continuar sendo o IGPM. Ademais, é fundamental definir outras formas de custeio do transporte ferroviário de passageiros, de modo que a tarifa não seja a única fonte de receita. Em outras palavras, a adoção de receitas extra-tarifárias poderia aliviar o bolso do usuário, além de contribuir para o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão, na linha do que apontam estudos de entidades da sociedade civil que conhecem o tema, como a Casa Fluminense, o Observatório dos Trens e o Fórum de Mobilidade do RJ.

Por outro lado, a CPI ficou intrigada com a antecipação da renovação do contrato de concessão, feita na metade da vigência do prazo original. Com efeito, o contrato de concessão data de 1998, com duração de 25 anos, ou seja, válido até 2023. Contudo, em 2010, por ocasião da celebração do 8º termo aditivo ao contrato, a concessão foi antecipadamente prorrogada por mais 25 anos, passando a viger até 2048! Por que tanta pressa em antecipar a validade de uma concessão que responde pela operação de um serviço precariamente oferecido à população? Trata-se, no mínimo, de gestão temerária.

Aliás, por parte do Poder concedente, que é o governo do Estado do RJ, nota-se uma enorme fragilidade na fiscalização e na regulação do transporte ferroviário concedido. Em resumo, o Estado do RJ decidiu que não operaria mais diretamente o serviço (1998), mas jamais se estruturou, desde então, para fiscalizá-lo de forma rigorosa, a bem do interesse público. A Secretaria de Estado de Transportes (SETRANS) é de alta rotatividade: em três anos, já são quatro secretários. Nas oitivas promovidas pela CPI, o mais comum é ouvir gestores estaduais dizer: “cheguei há pouco tempo”, “assumi há menos de dois meses”, “não sei, porque sou novo no órgão”.

Não se trata de característica específica da gestão da área de transportes. O atual governo estadual, em praticamente todas as áreas, está grosseiramente loteado em função dos acordos pré-eleitorais feitos pelo governador, que, por serem desprovidos de lastro programático, mudam a cada estação. Não são alianças em torno de um programa. Trata-se da mais pura distribuição fisiológica de espaços no governo para saciar a fome de cargos de partidos, lideranças e grupos, inclusive, em certos casos, de alguns que anunciam querer derrotar Bolsonaro, mas, primor de contradição, não se constrangem por se aliar ao bolsonarismo no RJ.

Voltemos à precariedade na fiscalização, por parte do Poder Público. Além da fragilidade da SETRANS devido ao loteamento eleitoreiro do governo, a agência reguladora do setor, a AGETRANSP, criada em 2005, jamais fez um concurso público para composição de seu quadro funcional. Seu presidente, em audiência da CPI, afirmou que, para a fiscalização dos 270 KM de malha ferroviária e das 104 estações, a AGETRANSP, graças a um convênio com a Central Logística, empresa responsável pelo patrimônio ferroviário estadual, dispunha de apenas dez fiscais. Desde sua manifestação na CPI, tendo havido uma aposentadoria, esse número baixou para nove. A propósito, o presidente da Central Logística, outro recém-chegado na administração estadual, afirmou que houve na empresa, no ano passado, um programa de incentivo à aposentadoria, mas também disse que tem grande carência de quadros técnicos por causa dessas aposentadorias. Mas que política de pessoal é essa? Incentiva a aposentadoria de quem a empresa precisa para funcionar? E por que a AGETRANSP não treina parte de seus servidores comissionados para atuar na fiscalização?

Como não é possível esgotar o tema neste artigo, concluo com algumas inquietações: a) a supressão da linha expressa do ramal de Santa Cruz, sem aviso prévio, obriga os usuários a fazer uma viagem até a Central com parada em 34 estações, numa clara afronta à qualidade de vida dos trabalhadores; b) ao final do ramal de Saracuruna, há uma bifurcação para Guapimirim e Vila Inhomirim, em que as composições são muito precárias; o intervalo entre as viagens é de quatro horas ou mais e alguns trechos estão sem serviço devido ao problema numa ponte, que caiu no esquecimento: como os usuários podem assumir compromissos (inclusive de emprego) nessas condições? c) há áreas controladas pelo crime: nem o Poder Público nem a concessionária dominam o território de certas estações ferroviárias: é a falência do Estado! Esse tema remete ao grave problema de furto e roubo de cabos, que, embora não deva ser usado como desculpa para tudo, compromete, de fato, a operação do serviço. Sobre o tema, a força-tarefa criada e alardeada pelo governador, no mês de setembro de 2021, em nada mudou o quadro, que até piorou desde então.

Diante de tudo isso, o governador propõe agora o Metrô Leve na Baixada Fluminense. Ora, basta investir em modernização da infraestrutura, segurança, acessibilidade e conforto, que os três ramais ferroviários que cortam a Baixada (Japeri, Belfort Roxo e Saracuruna) passarão a operar como um excelente metrô de superfície! Em silêncio até a instauração da CPI, Cláudio Castro passou a criticar, de forma oportunista, os serviços da Supervia, dizendo até que poderia reassumir a operação. Mas, como? Sem servidores, sem concursos, sem políticas, sem gestão estável na SETRANS? Chega de pirotecnia! Já passou da hora para o governador, que se diz “sem tempo a perder”, resolver os problemas que afetam o povo fluminense.


*Professor da UFF e deputado estadual (PSB)


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