Favela é cidade - Artigo de Waldeck Carneiro
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Favela é cidade - Artigo de Waldeck Carneiro

Waldeck Carneiro*


Zuenir Ventura escreve sobre a "Cidade partida". Adair Rocha discorre sobre a "Cidade cerzida". Jailson Souza, Jorge Luiz Barbosa e Mário Simão ressaltam que "A favela reinventa a cidade". Apenas os títulos desses livros já revelam que as favelas e demais áreas populares, em especial na Região Metropolitana do RJ, se configuram como grande desafio às políticas urbanas, econômicas, sociais, culturais, de direitos humanos (educação, saúde, saneamento, moradia) e de segurança pública, entre os aspectos mais enfáticos.

Antes, é preciso vencer o preconceito: as abordagens recorrentes sobre favelas tendem a tratá-las exclusivamente como sinônimos de violências e carências, desprezando o que elas expressam e produzem em termos de criatividade, diversidade, solidariedade. Sim, o impacto da violência nesses lugares é real, seja aquela fomentada, em muitas delas, pelo crime, mais ou menos organizado, seja por ações violentas encetadas pelo próprio Estado por meio de seu aparelho repressivo. Também é fato que as favelas são lugares em que se identificam carências, provocadas pela histórica ausência dos poderes públicos, seus órgãos e suas políticas.

No entanto, talvez não haja lugar mais virtuoso em matéria de criatividade: soluções urbanas, produção cultural por meio das mais diversas manifestações, empreendedorismo criativo. As favelas são também feitas de potentes redes de solidariedade. Por exemplo, neste contexto dramático da pandemia do novo coronavírus, são aquelas redes que amortecem o grave impacto da pandemia na vida cotidiana dos territórios populares, que, com raras exceções, tiveram que se virar sozinhos, sem apoio governamental. Nesse cenário, cresceram e se empoderaram as ações solidárias forjadas e coordenadas por coletivos locais: distribuição de alimentos, campanhas de prevenção, transporte solidário de pessoas infectadas, financiamento coletivo de enterros das vítimas fatais.

Nos últimos meses, a ALERJ vem dando respostas contundentes para enfrentar a pandemia em territórios populares: plano de combate à pandemia, transferência de recursos à FIOCRUZ para viabilizar ações contra a Covid-19, dia estadual de mobilização contra a Covid-19, linha de crédito para micro e pequenos empreendedores, tudo isso com foco nas favelas. Além dessas iniciativas, destaco a Lei Estadual 9131/20, aprovada em dezembro passado, que institui o Plano de Desenvolvimento, Cidadania e Direitos em territórios de favela e demais áreas populares do RJ (Plano de Metas Favela Cidadã), com o fito de combater as inúmeras negações e violações de direitos nestas localidades e ali consolidar um ambiente de promoção de desenvolvimento, cidadania e direitos. Trata-se de política de Estado (chega de pirotecnia e do "melhora mas não resolve"), duradoura, para derrotar inúmeras desigualdades que afetam drasticamente o cotidiano e decisivamente o futuro da população daqueles territórios.

A Lei dispõe sobre a formulação, a implementação e a avaliação de políticas, serviços e oportunidades, de forma permanente e prioritária, nas mais diferentes áreas. O Plano e suas respectivas metas serão periodicamente avaliados, a fim de que seja estabelecido o Índice de Desenvolvimento, Cidadania e Direitos em territórios de favela e demais áreas populares (IDCD-Favela). O Plano prevê ainda a participação protagonista de entidades e coletivos da sociedade civil, especialmente daqueles que atuam em territórios de favela, através do Comitê de Monitoramento, que também terá outras representações e monitorará o cumprimento das metas do Plano. Assim, por meio de conferências bienais, o Plano será avaliado e poderá ter suas estratégias de ação adaptadas para cada novo período de implementação.

No tocante à superação da crise econômica persistente no RJ, reafirmo a urgência da elaboração de um plano estratégico de desenvolvimento econômico e social, que aponte, entre seus eixos prioritários, o enfrentamento às desigualdades absurdas que existem, na qualidade e na expectativa de vida, entre pessoas que vivem em territórios "periféricos" (do ponto de vista geográfico, urbano e sociológico) e aquelas que habitam bairros visibilizados pela presença de políticas, serviços e oportunidades. Nessa direção, é imperioso derrotar o crime e instalar a República em áreas cada vez mais extensas que têm sucumbido ao domínio das narcomilícias. Para isso, urge implementar uma agenda de Estado nos territórios populares, exatamente como propõe a Lei Estadual 9131/20. Afinal, a favela pode reinventar a cidade: as cidades partidas precisam, de uma vez por todas, se integrar em uma só, cerzidas por políticas de desenvolvimento, cidadania e direitos, formuladas e implementadas numa perspectiva igualitarista, solidária e democrática.



*Waldeck Carneiro é Professor da UFF e

Deputado Estadual (PT-RJ)

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